sexta-feira, 27 de junho de 2014

Atalhos de fuga da Copa do Mundo


Aqui vão dicas de entretenimento pra você que não curte futebol e quer sair desse clima de Copa. São duas excelentes animações que têm em comum - pelo menos ao meu ver - misticismo e espiritualidade. Há tempos que esse gênero cinematográfico deixou de ser "coisa de criança". Os estúdios, produtores e demais profissionais envolvidos na feitura desse tipo de filme, têm evoluído e cativado cada vez mais o público adulto. 






"O gato do rabino" relata a história de um gato que pertence à filha de um rabino - figura mais importante do judaísmo, no que tange ao sacerdócio. Num dado momento da história, o gatinho começa a falar e, com esse feito, a gerar muitas confusões. A película traz emoção, um certo debate quanto à religião, aventura e violência - pequenas porções, mas sempre é bom avisar. ; ) Ah! Já ia me esquecendo de algo: 
ironia. Você terá grandes pitadas desse maravilhoso ingrediente.Clique aqui e assista um trailer de "O gato".




Já em "Kiriku e a Feiticeira", temos a presença do misticismo africano, suas crenças, mitos e medos. Kiriku é uma criança especial, corajosa e desbravadora - isso é pra dizer o "mínimo", pois ele pede para nascer, sai da barriga da mãe falando e andando de forma hiper desenvolta.  O menino excepcional "abraça" a missão de acabar com o domínio da Feiticeira Karabá, mulher com grandes poderes, que assola a tribo do pequeno Kiriku trazendo a escassez de recursos hídricos, perda dos homens valentes e o ouro que embelezava suas mulheres.
Uma animação bem traçada, com lirismo, cânticos e um pouco de história de amor também. O longa é disponibilizado na íntegra e em versão dublada no Youtube. Basta apenas um clique aqui e dispor do conteúdo!
Bem, essas são minhas dicas pra você que quer fugir desse clima futebolístico que cerca nosso país e se entreter um cadim com a sétima arte. Boa fuga! 

 

sábado, 17 de maio de 2014

Quanto vale um poeta

Fonte: Livros só mudam pessoas

Pela primeira vez é reunida a obra completa do poeta baiano Waly Salomão (1943-2003), ícone do tropicalismo, letrista de sucesso e figura marcante na cena cultural brasileira. O lançamento, de quase 500 páginas, traz mais lenha para uma rara ebulição na literatura nacional: a poesia está conquistando as redes sociais, sendo mais lida e ganhando espaço no mercado editorial brasileiro como nunca, desfazendo o estigma de arte feita para poucos e que não vende bem. Editoras do porte de Companhia das Letras, Cosac Naify, Record e LeYa vão publicar neste ano antologias de poetas já consagrados que ainda não tinham a sua produção reunida, como Adélia Prado, Murilo Mendes e Jorge de Lima.
Livro de 540 páginas de Waly Salomão traz canções inéditas, em livro, de parcerias com Caetano Veloso, Gilberto Gil, João Bosco, Jards Macalé e Adriana Calcanhotto
Livro de 540 páginas de Waly Salomão traz canções inéditas, em livro, de parcerias com Caetano Veloso, Gilberto Gil, João Bosco, Jards Macalé e Adriana Calcanhotto
O frenesi da poesia extrapola as décadas de 1970 e 80, chegando aos contemporâneos. Novos poetas, como Bruna Beber, Angélica Freitas, Gregório Duvivier – o humorista de Porta dos Fundos -, entre muitos outros, estão obtendo êxito nos mundos virtual e real, animando os editores pela qualidade literária e pela popularidade que têm nas livrarias.
A guinada da poesia teve seu gatilho no ano passado, com a absolutamente imprevisível venda de 90 mil exemplares de “Toda Poesia”, de Paulo Leminski (1944-1989). A reunião de 630 poemas do mestre das sacadas rápidas, do haicai e da ironia, liderou a lista de livros mais vendidos no país, ficando à frente de best-sellers, como a trilogia “50 Tons de Cinza”. O topo desses rankings era espaço até então intocado pela poesia. O fenômeno Leminski foi uma surpresa para a própria Companhia das Letras, que havia feito uma tiragem inicial tímida, de 5 mil exemplares, e teve de lançar mão de diversas reimpressões.
No embalo do sucesso do poeta curitibano, foi a vez de Ana Cristina Cesar (1952-1983), uma das maiores representantes da poesia marginal. Sua “Poética” foi lançada em novembro e já vendeu quase 10 mil exemplares. O livro de Ana C. (como a escritora gostava de ser chamada) ganhou os mesmos moldes do de Leminski, capa fluorescente – lembrando a moda dos anos 80 -, cerca de 500 páginas e acompanhada da fortuna crítica mais relevante. “A exemplo do Leminski, a obra dela estava fora do radar, muitos livros estavam esgotados, havia uma carência no mercado”, explica a editora Sofia Mariutti, da Companhia das Letras.
A editora sacou, então, ter uma fórmula que vem dando certo: resgatar a obra de poetas com estilo pop dos anos 80, cuja produção estivesse abandonada ou esparsa demais, e entregar a um público jovem ávido por cultura compartilhável, papel que o poema desempenha muito bem. É nessa linha que acaba de sair a obra completa de Waly Salomão, “Poesia Total”. A coletânea reúne sua produção desde “Me Segura Que Eu Vou Dar um Troço”, de 1972, passando por “Algaravias”, que ganhou o Prêmio Jabuti de poesia em 1997, até “Pescados Vivos”, de 2004. O volume, de 540 páginas, traz também algumas canções inéditas em livro – Waly teve poemas musicados por artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, João Bosco, Jards Macalé e Adriana Calcanhotto.
A poesia anárquica, experimental e violenta de seu livro de estreia, “Me Segura Que Eu Vou Dar um Troço”, é muito mais bem entendida se inserida no contexto em que foi escrita: em uma cela do Carandiru durante a ditadura. Os versos, espécie de poema-prosa, lembram letras de rap que ficaram famosas décadas depois: “Aqui existe companheirismo./ Aqui igualou todo mundo ao nível do merdame./ Aqui todo valente se caga todo covarde faz força/ toda vaidade se apaga”. O original do livro, diagramado por Hélio Oiticica – que assina um dos ótimos textos críticos que recheia o lançamento -, foi apreendido por militares que confundiram a diagramação cubo-construtivista com uma ameaçadora linguagem cifrada e nunca mais foi recuperado em sua totalidade.
Gregório Duvivier, que lançou seu livro de poesias em novembro e já vendeu 7 mil exemplares, estará na edição da Flip deste ano
Gregório Duvivier, que lançou seu livro de poesias em novembro e já vendeu 7 mil exemplares, estará na edição da Flip deste ano
Prestes a completar 80 anos, Adélia Prado, uma das maiores poetas vivas no país, também terá uma antologia completa lançada, pela Record, até o fim do ano. Seu último livro, “Miserere”, lançado em dezembro, vendeu cerca de 5 mil exemplares. “Poesia dá lucro, sim!”, diz Carlos Andreazza, editor-executivo de ficção nacional da editora Record, que também está trabalhando na obra completa do poeta cearense Adriano Espínola para 2015.
Segundo Andreazza, um dos fatores que têm mantido a obra da poeta em evidência é a sua constante aparição em eventos literários. “Adélia tem circulado muito em eventos e encanta o público jovem com sua fala simples. A poesia tem aquela imagem pesada e, quando uma poeta dessa categoria vai ao público, essa barreira é quebrada, isso atrai os jovens”, diz.
Para Adélia, mineira de Divinópolis cuja poesia foi revelada nos anos 70 por Carlos Drummond de Andrade, um dos fatores que podem explicar essa popularidade da poesia atual seria uma necessidade maior das pessoas de procura por transcendência de algo que tenha significado para além do imediatismo do cotidiano e do consumismo desenfreado. “As pessoas estão procurando na literatura, e outros na religião, uma proposta diferente que ofereça o transcendente”, afirma Adélia. Na opinião dela, a poesia não tem uma função utilitária, mas exatamente porque não serve para nada serve para tudo. “A poesia oferece um espelho de humanidade, é o rastro da pegada divina no meio da poeira das coisas.”
Outras editoras também estão seguindo o caminho de reeditar poetas já consagrados e apresentá-los com uma nova “roupagem” ao público. A Cosac Naify vai reeditar a obra completa – poesia e prosa – de Murilo Mendes. O primeiro título a sair é uma antologia poética: em setembro, a editora lança a obra “Poemas”, de 1930, e, no mês seguinte, o volume de poesia “Convergência”, de 1970. Outra novidade é Jorge de Lima (1893-1953), cuja poesia inspirou o musical “O Grande Circo Místico”, de Chico Buarque e Edu Lobo. No fim de 2013, a Cosac lançou “Invenção de Orfeu” e, em junho, está programada uma antologia poética do autor.
O poeta mexicano Octavio Paz (1914-1998) também terá sua antologia publicada aqui em 2015. “A Cosac aumentou o espaço para poesia nos últimos anos. Queremos fazer belas edições críticas, quando possível, da poesia completa, edições que fiquem como cabedal e referência e sejam agradáveis de ler e manusear”, diz Heloísa Jahn, editora de poesia da Cosac Naify.
Antes ainda do “fenômeno Leminski”, em 2011, a editora LeYa já havia reeditado a obra do poeta Manoel de Barros – com direito a um livro então inédito – e, de lá para cá, já foram vendidos 30 mil exemplares, isso sem contar a venda para escolas em programas governamentais. De acordo com Pascoal Soto, diretor-editorial da LeYa, ele é o autor de literatura brasileira que mais vende na editora, responsável por 30% do faturamento de ficção.
"Rua da Padaria", livro da poeta Bruna Beber, foi o mais vendido na última Flip entre todos os livros nacionais e estrangeiros de todas as categorias
“Rua da Padaria”, livro da poeta Bruna Beber, foi o mais vendido na última Flip entre todos os livros nacionais e estrangeiros de todas as categorias
“Recebemos cada vez mais pedidos para incluir fragmentos da obra dele nas mais diversas publicações, o que mostra a vitalidade da poesia de Manoel”, conta Soto. Segundo ele, os autores contemporâneos de poesia têm sido mais cobrados no vestibular. “É um ingrediente fortíssimo para aumentar o consumo de poesia.” Recentemente, a mesma antologia de Manoel de Barros pela LeYa deixou o modelo branco básico para ganhar uma roupagem verde fluorescente nas livrarias.
Alice Ruiz prepara para este ano um lançamento com haicais tradicionais, nos moldes japoneses, com direito a ilustrações. “Os aforismos, os haicais e poemas curtos funcionam muito nas redes sociais”, acredita Sofia Mariutti, editora de Alice. Em 2013, o livro mais vendido da Companhia foi o “Boa Companhia – Haicai”, coletânea organizada pelo poeta e jornalista Rodolfo Gutilla que reúne poemas de Leminski, Alice, Haroldo de Campos e Luis Fernando Verissimo, entre outros.
Não são apenas as reedições de poetas já consagrados, no entanto, que estão atraindo as editoras: nos últimos anos, elas estão apostando em versos de novos autores. A Cosac Naify tem Angélica Freitas, dona de uma poesia urbana e muito criativa, revelada no livro “Rilke Shake”, de 2007: “Ai que bom seria ter um bigodinho/ além das lentes dos óculos ficar / escondida por trás de uma taturana/ capilar/ um bigodinho para poder estar/ um bigodinho para sair à rua e ver/ o mundo mas se esconder”. A Cosac lançou agora outro livro da autora, “um útero é do tamanho de um punho”, uma série de poemas que têm como pano de fundo do universo feminino atual e alguns experimentos poéticos com a internet, as chamadas “googlagens”, que são poemas feitos com o auxílio do Google. “Há mais poetas fazendo isso, por exemplo, poemas feitos a partir de spam”, diz Angélica.
Outra revelação é “Rua da Padaria” (Record), da poeta Bruna Beber, o mais vendido na última Flip entre todos os livros nacionais e estrangeiros de todas as categorias. O sucesso rendeu-lhe o apelido de “Leminski de saias”.
Bruna começou a escrever em um blog na internet, conheceu outros poetas virtualmente e começou a publicar também em revistas eletrônicas. Demorou quatro anos para escrever “Rua da Padaria”, chegou a fazer 19 versões do livro, que já vendeu 2.600 exemplares. Os 26 poemas que o compõem remetem sempre à infância passada na Baixada Fluminense e estão organizados de forma a parecer o encontro de duas esquinas. A sensação é a de um passeio em um subúrbio carioca: “mamãe posso comer/ essa pipoca/ não pode minha filha/ é macumba/ macumba não pode comer./ e o guaraná pode/ ah mãe deixa.” “Depois de ler o livro, muita gente vem me contar uma história, todo mundo tem seu subúrbio particular”, relata Bruna.
O cotidiano do Rio é o cenário para os versos de “Ligue os Pontos – Poemas de Amor e Big Bang”, de Gregório Duvivier, que estará na Festa Literária de Paraty (Flip), entre 30 de julho e 3 de agosto. No livro, que foi lançado em novembro pela Companhia das Letras e já vendeu quase 7 mil exemplares, Duvivier põe em versos cenas familiares em lugares como a praia, avenidas cariocas, supermercados, com um misto de humor e melancolia: “o bairro de botafogo/ se fosse um senhor/ usaria óculos fundo/ de garrafa e daria/ bom-dia aos pássaros/ cantores que já não/ moram na varanda”.
"A poesia oferece um espelho de humanidade, é o rastro da pegada divina no meio da poeira das coisas", afirma Adélia Prado, que terá antologia lançada neste ano
“A poesia oferece um espelho de humanidade, é o rastro da pegada divina no meio da poeira das coisas”, afirma Adélia Prado, que terá antologia lançada neste ano
Duvivier faz na poesia um pouco do que faz nos palcos – rir da tragédia, considerando que, na arte e na vida, o humor seja a salvação. “Acredito que a poesia se parece muito com o humor: o objetivo é puxar o tapete das certezas e jogar um novo olhar sobre o mundo. Tanto o poeta quanto o humorista ou o cronista têm como objetivo a revelação do mundo sob uma nova ótica, à qual o leitor não está acostumado”, comenta Duvivier, que é formado em letras. Para ele, até há algum tempo, a poesia havia deixado de ser popular e virado “uma coisa chata, acadêmica” e pouco oral, com pouca ligação com a vida. “O Leminski reabriu muitas portas. As pessoas estão vendo: poesia pode ser pop. A poesia está voltando para a rua.”
Como Waly Salomão já provocava nos versos do poema “Exterior” – “Por que a poesia tem que se confinar?/ às paredes de dentro da vulva do poema?” -, os poetas estão circulando mais, em uma quantidade enorme de saraus e eventos literários pelo país, mudando a imagem de poeta recluso cristalizada no imaginário popular. Quando não se movem fisicamente, pelo Twitter, Facebook e demais redes sociais, suas estrofes passam de mão em mão. Na opinião de Andreazza, editor da Record, não dá mais para o poeta escrever o livro e ir para casa esperar o retorno, e os autores têm compreendido que a poesia precisa ir para a rua, de algum modo. “Essa é a grande mudança: o poeta não é mais recluso, está popularizando a poesia, que está mais visível e mais acessível”, acredita.
No entanto, ainda são poucas as pessoas que já viram, tocaram e, mais ainda, puderam trocar algumas palavras com um autêntico poeta. Tempos atrás, em uma escola de Sobradinho (DF), a professora avisou aos alunos que iriam receber a visita de um poeta, ao que um gaiato respondeu: “Impossível, professora, eles já estão todos mortos”. A assombração em questão era Nicolas Behr, poeta brasiliense. Ele, que se considera um divulgador obsessivo de sua obra, não se incomoda com a fama de “poeta marqueteiro”, que era replicada aqui e acolá na II Bienal do Livro e da Leitura de Brasília em abril, onde o mercado editorial de poesia mereceu um painel exclusivo.
Quem não consegue vender seus livros com as próprias pernas país afora tem na internet por vezes a única alternativa de chegar ao leitor/cliente. Essa realidade não se restringe aos poetas amadores e atinge até alguns premiados, mas publicados fora do “mainstream” das grandes editoras. O poeta paulista Ademir Assunção, vencedor do Jabuti de 2013 na categoria poesia com o livro “A Voz do Ventríloquo”, da editora Edith, só vende pelo seu site. “Mesmo vencendo o prêmio, meu livro não está em nenhuma livraria. As exigências e as regras da venda em consignação são muito predatórias para as pequenas editoras”, disse Assunção, durante bienal.
A imagem de poeta solitário definitivamente parece não pertencer a essa geração, que defende em coro que a poesia tem que circular. “Uma vez vi uma menina na escola escrevendo um poema do Vinicius na agenda e pensei: esse é o meu sonho, que escrevessem meus poemas na agenda. Acho que essa é a glória de um poeta, circular nas agendas, nas pichações da rua, nos muros de cortiça e – porque não? – nos murais do Facebook”, conta Duvivier. Para Bruna Beber, os poetas de sua geração estão muito ativos, até mesmo em eventos que misturam poesia com outras artes e acabam atraindo um público novo para os poetas. “O poeta está voltando à sua função inicial, na Grécia, de circular entre as pessoas, e eu me identifico com esse perfil”, afirma Beber.
Como define Adélia Prado, a poesia é a coisa mais “anti-intelectual” que existe. “Ela é para a sensibilidade, pode ser entendida por um analfabeto. A pessoa que tem um orgulho acadêmico muito grande está fechada para a poesia. Ela é dedicada a quem tem coração.” Para as editoras, aparentemente, o limite de suas publicações e vendas de poesia parece cada vez mais buscar esse mercado, restrito às pessoas que têm coração pulsante, com atenção especial àqueles sensíveis a uma cor fluorescente chocante.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Todos queremos ir a Macondo

Soube hoje pela manhã da morte do brilhante Gabriel García Márquez... Confesso que contive as lágrimas! Vieram à minha mente várias formas de homenageá-lo, mas tudo parecia pequeno, repetitivo e raso. Quando vi o texto do amigo Daniel Massa, poeta de extrema sensibilidade, e pensei: - Vou republicá-lo! Foi através do Daniel que tive contato com uma das obras-primas de Gabo, Amor nos tempos do cólera. Nós ainda cursávamos a faculdade de Letras, quando o meu querido manow teve um gesto de generosidade para comigo e me fez mais apaixonada ainda por Márquez. Obrigada, Daniel! Obrigada, Gabriel!

Fonte: Eu sou um sapo


No último sábado, fui convidado em cima da hora para uma festa em homenagem aos estudantes latinos na França. Aceitei, claro.
Não sou o que se pode chamar de uma pessoa simpática, mas consegui fazer alguns amigos aquela noite. Conversei longamente com amáveis russas, ajudei os franceses com as tarefas domésticas, adicionei um sorridente panamenho no facebook e assisti às meninas dominicanas dançarem no melhor estilo chacal rápido e rasteiro. Mas talvez tenha sido o minuto e meio em que conversei com uma colombiana que me marcou mais. 
É um vício um pouco idiota esse que a gente tem de procurar referências óbvias de um país estrangeiro para estreitar laços com seus habitantes. Outro dia, me despedi de uma mexicana no bar aos gritos de “Viva Zapata!”, ao que a moça — penteado britânico, roupa americana e inglês fluente desfilado durante toda a noite — sorriu amarelo e balançou a cabeça: “Babaca”.
Que merda. Os latinos na França são todos ingleses.
Enquanto a colombiana procurava uma música de seu país no youtube, eu disse:
— Coloca Shakira.
Ela foi sagaz.
— Shakira é americana, não tem nada a ver com a Colômbia.
Ponto. Foi o suficiente para que na frase seguinte eu abrisse meu coração.
— Gabriel García Márquez mudou a minha vida.
Ela sorriu e tentou repetir sem sucesso o que eu disse para a sua amiga que dançava algo como el baile del perrito.
Tudo bem. Ali eu já havia reacendido uma antiga paixão.
Tinha 15 anos quando li Cem anos de solidão a primeira vez. Era um garoto que ficava errando pelos livros da biblioteca da escola e foi assim me deparei com uma coleção de banca de jornal d’O Globo. Olhei o livro com a capa toda azul e li o título na lateral. Quando se é adolescente, qualquer minuto sozinho é insuportável, cem anos me pareciam muito tempo para se cultivar a solidão. Li.
E Gabriel García Márquez mudou a minha vida.
Ele me fez prestar vestibular para Letras, ele me fez continuar escrevendo poemas e ficções, ele me fez ser professor de literatura.
Hoje, a notícia mais recente que eu tenho de Gabo fala sobre o seu estado avançado de demência senil. Não há memória. Não há mais livros. Não há sequer um rosto familiar para Gabo. Talvez ainda haja espaço para qualquer coisa de bonito, que lhe invade a cabeça quando bate um vento mais forte e sai antes mesmo que possa deixar qualquer vestígio de que esteve por ali.
E é assim que eu vejo Gabriel García Márquez hoje. Vivendo numa Macondo que ele ergue todos os dias e se desmancha antes mesmo de ficar pronta, abrindo espaço para uma nova construção na manhã seguinte.



segunda-feira, 31 de março de 2014

Despedida de março, o mês da poesia

Compartilho com vocês alguns rabiscos de minha autoria para fecharmos o mês da poesia - ih! rimou! rs

Ressurreição
Um ambiente com livros é cheio de vida e frescor
Porém, a morte está lá fora a me sondar
E daí, se ela me tragar?!
Os livros irão me ressuscitar


Exultação
Hoje eu tô explodindo de alegria
Cantaria
Dançaria
Saltaria
E até beijaria o português da padaria

Eco
Sudorípara
PARA
PARA
PARA
Lacrimal
MAL
MAL
MAL
As duas são glândulas
E delas saem substâncias com gosto de sal


sábado, 8 de março de 2014

Dia Internacional da Mulher

Aproveitando o ensejo da data comemorativa de hoje, compartilho com vocês um poema publicado em Feminino Sagrado. Mulher, não desista de seus sonhos! Lute sempre!


Vem irmã
Dancemos unidas pelo coração
pés batendo forte no chão
mãos em agradecimento
olhos lavados de emoção

Vem irmã
de mãos dadas somos mais fortes
somos mais doces
somos mais plenas
somos mais amor

Vem irmã
vamos celebrar nossos corpos
saudar nosso ventre
agradecer nossa alma

Vem irmã
a terra nos sustenta
as águas nos abençoam
o fogo nos purifica e anima
o ar nos presenteia com sonhos

Vem irmã
sem medos do futuro
seja lá o que ele for
pois a semente está aqui
e no útero da vida
não existe dor

Vem irmã
num bailado mágico
entre corpos e almas
entre choros e risos
entre abraços e acolhidas

Vem irmã
celebrar a vida
que nasce
dançar a morte
de tudo o que não somos

Vem irmã
nossa missão é sagrada
nossa alma divina
nossa dança, medicina
nossos corpos, templos
nossos olhos, janelas
nossas vidas
ETERNAS

Rose Kareemi Ponce

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Tadinha

Seu nome era Tádara, apelidada pelos seus de Tadinha. Ela era uma menina comum, família normal – se é que podemos chamar aquilo de normal – e tinha muitos amiguinhos na rua em que morava.

Na escola, destacava-se dos demais. Era um tipo peculiar de aluna: amada pelos professores, odiada pelos coleguinhas e querida pela maioria dos pais.

Tanto empenho e dedicação não podiam dar em outra coisa: ao final do Ensino Médio, Tádara passa com louvor para uma aclamada universidade pública. Todos ao seu redor se alegram, exultam e saltam com o feito da queridinha da galera.

Mas no íntimo, a menina dos sonhos largos travava um grande combate: será que esse era o melhor caminho a seguir? O que ela quis dizer com isso? Tadinha questionava-se quanto à sua personalidade cdf, aquela que lhe trouxe popularidade, mas também distanciamento de alguns. Será que valeria a pena passar pelo bullying de outrora? – o que, na sua época, nem recebia esse nome, tudo não passava de relés implicância de criança.

Enfim, Tádara fez uma escolha: mudar! Chega de ser a excluída, a apontada como alienígena, a sem vida social. Mudanças são boas... nem sempre!


O tempo passou, a vida seguiu com seu rumo certo – nem tanto para nossa cdf – e a jovem não se estabilizou. O que houve com Tádara? Não se sabe... Mas ela sempre se pergunta onde foi parar a estudante brilhante que fora outrora... Tadinha.

Mãe de amigo

Amigo é coisa pra se guardar no lado esquerdo do peito, já dizia a famosa canção que todos conhecem e, acredito, gostem.
Eu confesso: tenho poucos amigos e, sim, eles moram em meu coração. Costuma-se dizer hoje em dia que os amigos são a família que escolhemos, mas vou além: fui escolhida pelos meus.
E vou adiante, meu coração é pequeno e pesa pouco, mas eu estendo seu espaço e insiro a mãe dos amigos. Ah! Como é bom mãe de amigo! Uns chamam de tia, eu prefiro dona – apenas uma questão de escolha, não sou do grupo dos “radicais” que abomina o termo “tia” (não é irmã do meu pai ou da minha mãe, pô!). Não, sou relax.
Como é bom ser acolhida e recebida nos lares de meus amigos por suas mães. Mas melhor ainda é essa “mãe de amigo” ter história, rosto e lembrança pra mim. Não é aquela relação distanciada, onde eu nem sei o nome da progenitora do brother.
Tem a Maria... Pernambucana arretada, mão boa pra cozinha. Ah! Sabe o que eu descobri? Ela tem duas certidões de nascimento! Que loucura! rs
Tem a Lili... Ela e as irmãs têm o nome iniciado com a letra E ou pelo seu som.
- Mas Lili não começa com E! O nome dela é Elisete, mas ela não gosta muito. Carabina, tu gosta de uma mentira!
Tem a Lucinha (é, eu chamo as mães dos amigos por apelido :P)... Outra nordestina lutadora, cabelo de índio e adora uma casa B-E-M arrumadinha. Um dia serei como ela...
Tem a Stelinha... Guerreira, voz de rouxinol e agora virou universitária! A UFF não será mais a mesma...
Tem a Neusinha... Adora uma cevadis, tem papo reto e sorriso aberto.
Ah! Tem a Edilce... Ela não está mais entre nós, partiu na semana passada. Mas o que ela deixou? Dois filhos maravilhosos, muita doçura e gentileza em todos seus gestos. Ah, amadinha... Quantas saudades dos momentos que passei a seu lado!
Ela, como as demais mães aqui citadas, são exemplos de mulheres para mim. Venceram obstáculos, lutaram com afinco em prol dos seus ideais e o melhor de tudo: são (foram) mães maravilhosas dos meus amigos mais que maravilhosos. : )

Obrigada, Deus pelas mães de amigos.